A maior parte dos animais da Terra são insetos. Na verdade, 99% dos cérebros no planeta podem pertencer a invertebrados. E nem todos os insetos são pragas – alguns são extremamente benéficos para os humanos, e insetos como os bichos da seda e as abelhas têm sido domesticados por pelo menos quatro milénios. Com o reconhecimento dos danos no ambiente da pecuária, muitos estão cada vez mais a ver os insetos como uma fonte de proteína sustentável alternativa.
Para além da polinização, os insetos criados para utilização humana já fornecem, por exemplo, controlo de pragas.
Mas se escolhermos criá-los numa escala ainda maior, precisamos de entender as suas capacidades mentais, e as repercussões dessa criação para consumo.
Eles são capazes de sentir dor? Eles são autoconscientes? Considerando os seus cérebros, comportamento e habilidades de comunicação, serão eles sencientes? Este artigo analisa as evidências para responder a estas questões.
Os insetos existem há cerca de 400 milhões de anos. Talvez devido a esta longa história, os seus cérebros parecem estar organizados de uma forma muito eficiente e funcional. Ainda assim, o número de neurónios nos cérebros dos insetos é comparativamente pequeno. As abelhas, por exemplo, têm 960,000 neurónios, enquanto que um rato tem 75 milhões, e um humano tem 85 biliões.
Todavia, o número de neurónios pode não ser um indicador confiável para a consciência ou a senciência. Se um animal é consciente de um objeto externo ou estado interno, é considerado como consciente. A senciência requer que o animal seja consciente ou responsivo a impressões sensoriais. Os insetos apresentam comportamentos sofisticados e capacidades cognitivas desproporcionais relativamente aos seus cérebros minúsculos. Para além disso, a senciência pode ser mais uma função de organização do cérebro, em vez de estar relacionada com o seu tamanho.
Os animais, incluindo os humanos, aprendem de formas diferentes. Na aprendizagem social, os comportamentos novos surgem de observar e imitar os outros. Na aprendizagem associativa, um animal liga uma ideia ou comportamento a uma experiência. Os insetos demonstram ambos os tipos de aprendizagem: os grilos podem aprender como se esconder de aranhas-lobo; os abelhões voam mais rápido quando há uma recompensa mais doce envolvida; as aranhas saltadoras apresentam flexibilidade comportamental movendo-se para longe da presa antes de se aproximarem, presumivelmente para melhorar as suas hipóteses de uma caça bem sucedida.
A comunicação é outra característica de uma maior cognição. A nossa habilidade para comunicar verbalmente é muitas vezes tomada como prova da nossa evolução mais avançada. Uma vez que, tanto quanto sabemos, os insetos não têm linguagem, eles comunicam-se de outras formas. E ainda assim, os insetos vocalizam; eles também usam o toque, olfato, paladar, químicos e vibrações para trocar informações.
Uma das questões mais importantes ao considerarmos a criação de insetos para consumo humano é se eles podem sentir dor. Algumas provas recentes, ainda que não conclusivas, sugerem que este é o caso. A ciência define a dor como “uma experiência sensorial e emocional desagradável associada a atuais ou potenciais danos nos tecidos”. “Nocicepção”, por outro lado, é a “habilidade de detectar estímulos que causam danos ao corpo ou o potencial para tal danos”. Para além disso, a dor tem uma componente emocional, enquanto que a nocicepção é emocionalmente neutra. Enquanto que os insetos apresentam muitas respostas comportamentais ou defensivas a estímulos adversos, não sabemos ainda com certeza se os insetos sentem “dor” – pelo menos na forma como pensamos nela.
A maioria das pessoas acham os insetos nojentos. Como nos sentimos em relação aos insetos terá um grande impacto na nossa visão deles como seres separados de nós, ou como co-animais. Também influenciará a forma como os tratamos, e o peso moral que damos às suas vidas. Ao considerarmos isto, é importante fazer a distinção entre bem-estar animal e direitos dos animais. O conceito de bem-estar animal garante aos animais o direito ao bem-estar, mas os interesses humanos podem sobrepor-se. Nesse caso, os animais devem ser tratados humanamente quando os seus interesses são quebrados. Em contraste, quando um animal tem direitos, os seus interesses não podem ser trocados em benefícios de outros.
Se decidirmos usar insetos como alimento, vamos precisar de matar muitos milhões deles – realisticamente, se eles se tornarem numa alternativa verdadeira, biliões destes animais.
E isto não deve ser encarado de forma leviana. Devemos aplicar o princípio de precaução e assumir que eles podem experienciar dor.
O aforismo “a falta de evidências não equivale à evidência da sua inexistência” aplica-se muito bem aqui.
Artigo adaptado de Faunalytics
Traduzido por Ana Lúcia