1. O Fenómeno Veggie: um segmento que não para de crescer
Quem são os Veggie? Veganos, vegetarianos, flexitarianos… estes termos soam cada vez mais familiar aos ouvidos dos portugueses e não sem justificação.
Nos últimos anos, pudemos constatar, tanto no nosso país como a nível europeu, uma tendência substancial para a redução do consumo de carne. Quer seja por motivos de saúde, por causas relacionadas com o ambiente ou por respeito e compaixão pelos animais, muitas são as pessoas que decidem adotar uma dieta maioritariamente ou exclusivamente vegetariana.
Um estudo realizado pela AC Nielsen para o Centro Vegetariano realizado no ano 2017 demonstrou que o número de vegetarianos em Portugal quadruplicou em apenas dez anos (entre 2007 e 2017), e estudos mais recentes mostram que estes números continuam em crescimento.
De maneira a compreender melhor esta propensão dos consumidores para reduzirem ou excluírem a carne dos seus pratos, diversas entidades têm levado a cabo diferentes estudos que nos ajudam a ter uma perspectiva mais clara de quem são estas pessoas e das razões que as levam a tomar estas decisões.
2. Portugueses prontos para reduzir o consumo de carne e pagar mais por produção sustentável
Em Portugal, um país onde tradicionalmente se come bastante carne e peixe, é cada vez maior o número de pessoas que se mostra disposta a reduzir o consumo de carne. Segundo os dados recolhidos pelo II Grande Inquérito da Sustentabilidade em Portugal, realizado por Luísa Schmidt e Mónica Truninger, investigadoras do Instituto de Ciências Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa, mais de metade (50,6%) dos participantes manifestaram predisposição para a reduzir o consumo de carne e para adotar uma alimentação de base vegetal (45,1%).
3. Veganos, vegetarianos e flexitarianos: a tendência de crescimento
3.1. O primeiro estudo da Lantern (2019)
Um outro estudo, intitulado “The Green Revolution” foi elaborado pela Lantern, uma consultora líder no setor da alimentação com amplo conhecimento e experiência no mercado ibérico, com o intuito de adquirir um maior conhecimento sobre o consumidor veggie em Portugal.
Os números do “The Green Revolution” (de 2019) apontavam para 7.4% ou 628 mil flexitarianos, o que representava a grande maioria dos consumidores veggie portugueses. Os vegetarianos seriam 0.9% ou 76 mil, enquanto que os veganos representariam 0.7% da população ou 60 mil portugueses, ou seja, um total de 1,6% vegetarianos ou veganos. Mas afinal o que distingue uns dos outros?
Os veganos são aquelas pessoas que decidem não consumir qualquer produto de origem animal, quer seja no que diz respeito à alimentação ou a outros bens de consumo essenciais como vestuário, calçado ou produtos de limpeza e higiene. Isto quer dizer que, no que toca a alimentação, não incluem qualquer produto ou subproduto de origem animal como é o caso dos ovos, produtos lácteos, do mel ou da gelatina.
Os vegetarianos, apesar de não comerem carne nem peixe, podem consumir os produtos acima citados. E os flexitarianos são aqueles que na maioria das suas refeições optam por uma dieta vegetariana mas que não prescindem, esporadicamente, de incluir carne ou peixe no seu prato. Ou seja, trata-se daquelas pessoas que diminuíram bastante o seu consumo de carne e de peixe, mas que não eliminaram completamente estes alimentos das suas dietas.
3.2. O segundo estudo da Lantern (2021)
Quem poderia achar que a tendência se tratava de uma moda, pode desenganar-se. O segundo estudo mais recente da consultora Lantern vem mostrar isso precisamente.
De acordo com o estudo de 2021, actualmente mais de 1 milhão de pessoas optam por uma alimentação vegetariana ou tendencialmente vegetariana: 43 mil veganos, 180 mil vegetarianos e 796 mil flexitarianos. Estamos a falar de 1 milhão e 19 mil pessoas em idade adulta, com mais de 18 anos, o que sugere que este número pode ser muito superior, se considerarmos que há muitos adolescentes a optar por este tipo de alimentação.
De todos estes grupos alimentares, o que registou um maior aumento foi aquele constituído por vegetarianos, com um incremento de 137% entre 2019 e 2021. Também os flexitarianos têm vindo a aumentar, tendo crescido 27% em dois anos.
Os flexitarianos, isto é, pessoas que têm vindo a reduzir significativamente o seu consumo de carne e peixe, e a trocar a proteína animal pela vegetal, ainda que não completamente, são os que mais têm crescido, representando 9,3% da população (796.000 pessoas).
Já os ovolactovegetarianos (ou vulgarmente chamados de apenas vegetarianos) – quem exclui todos os produtos de origem animal à exceção dos derivados – serão assim cerca de 2,1% em 2021, enquanto que em 2019, eram apenas 0,9%. Em relação à fração de portugueses que exclui completamente os ingredientes e produtos de origem animal, isto é, os veganos, serão cerca de 0,5% em 2021, contra 0,7% em 2019, sendo o único grupo que diminuiu nestes últimos dois anos.
A transição para este regime alimentar apresenta ser uma tendência em forte crescimento, pelo que muitos dos inquiridos revelaram ter começado este género de alimentação recentemente – 25% dos veggie começaram a sê-lo apenas no último ano.
A população em geral que não segue uma alimentação vegetariana também está empenhada em reduzir o consumo de carne, pelo menos é o que afirmam 41% dos portugueses. Olhando em particular para as carnes vermelhas, 34% da população afirma ter reduzido o consumo, bem como de enchidos, número que sobe para os 37%. O consumo de aves, por sua vez, diminuiu apenas em 8%. O consumo de lacticínios também registou um decréscimo: 19% da população reduziu o consumo de leite, 13% o de iogurte e 19% o de queijo.
4. Quem são estes novos “veggie”?
O trabalho efetuado pela Lantern revelou que os veggies encontram-se representados em todas as faixas etárias, mas é entre os mais jovens (18-34 anos) que nos deparamos com um maior número de veganos e de vegetarianos. A maior parte dos inquiridos que diz seguir uma alimentação maioritariamente de base vegetal está entre os 25 e os 34 anos (falamos concretamente de 6,3% dos inquiridos), seguidos pela faixa etária entre os 18 e os 24 anos, estes com uma percentagem de 5,7%.
As mulheres também parecem ter aderido mais do que os homens a esta tendência, representando 60% do total da população veggie portuguesa. Segundo o estudo, atualmente 1 em cada 7 mulheres portuguesas é “veggie”.
Relativamente à zona de residência dos participantes, há dados interessantes. A maioria dos inquiridos que segue uma alimentação veggie reside nas grandes cidades, mas a diferença, face a quem vive em cidades com menos de 100 mil habitantes, é de apenas 2%. Ou seja, 51% vive em grandes cidades e 49% vive em cidades não tão grandes. Estes dados podem levar-nos a pensar que o facto de se viver em zonas urbanas ou rurais não terá um impacto tão considerável nas escolhas alimentares.
Os dados do II Grande Inquérito da Sustentabilidade em Portugal, realizado pelo ICS confirmam que são as mulheres, mais do que os homens que manifestam disposição para esta mudança de hábitos. Também os inquiridos com nível de escolaridade elevado (ensino superior) e os residentes em áreas metropolitanas são os mais propensos a reduzir ou eliminar o consumo de carne.
No que diz respeito ao rendimento do agregado familiar dos novos veggie, ambos os pólos encontram-se representados “Os que se situam no polo de rendimentos mais baixo provavelmente não têm um orçamento que lhes permita adquirir carne ou peixe com frequência (…), reforçando a sua dieta com mais vegetais (normalmente na forma de sopa)”, explicam as investigadoras do ICS. “Os consumidores que se situam no nível de rendimento mais alto estão provavelmente em transição para uma dieta de maior base vegetal, eventualmente por preocupações de saúde e de sustentabilidade”, acrescentam.
5. Os principais motivos para adotar uma dieta veggie
As motivações que levam os diferentes grupos de veggies a seguir as dietas escolhidas são assim diferentes. Para os flexitarianos, a preocupação com a sua própria saúde é aquilo que mais os motiva a optar predominantemente pela proteína vegetal (74% indicou esse motivo), enquanto que a preocupação com os animais (30%) e sustentabilidade (29%) surge menos frequentemente.
Para Luísa Schmidt, investigadora do ICS, os dados mostram que “a questão da saúde entrou completamente nas preocupações dos portugueses”. “Isso vê-se na atenção a tudo o que tem a ver com o desperdício alimentar (…), mas também nas preocupações com a utilização de agroquímicos e na contaminação por bactérias, assim como com a utilização de hormonas nos alimentos”, afirmou. Isto é especialmente perceptível nas faixas etárias mais elevadas. Nas camadas mais jovens, trata-se muitas vezes de uma opção ética e sociocultural.
No que toca a vegetarianos e veganos, as preocupações principais diferem. A maioria (73%) aponta a preocupação ambiental como a principal força de motivação, seguida de perto da preocupação com o bem-estar e direitos dos animais (69%).
6. Um movimento que tem os seus efeitos no consumo global
O mundo está a mudar e os portugueses não fogem à regra. Mas será que esta é uma tendência passageira ou uma nova realidade que veio para ficar? David LaCasa, investigador da Lantern, refere que “mais do que uma tendência, esta é já uma realidade social consolidada, sobretudo entre as camadas mais jovens, atentas às problemáticas ambientais e de saúde”.
E tu, também já iniciaste esta transição?
Artigo por Tatiana Abreu.
Última actualização: 11 de março, 2022.