A soja é a principal culpada pela destruição e deterioração das florestas?
A principal responsável pela desflorestação é a agricultura, a nível mundial, devido à conversão de áreas florestais em terras agrícolas.
De acordo com a FAO, essa conversão é responsável por cerca de 50 % da desflorestação global, principalmente para a produção de óleo de palma e soja. Pelo que a soja tem, de facto, um elevado peso na deterioração das florestas.
O pastoreio de gado é responsável por quase 40 % da desflorestação global sendo que, na Europa, a conversão de florestas em terras cultivadas representa cerca de 15 % da desflorestação, com 20 % a dever-se à criação de gado.
Outras atividades prejudiciais que causam desflorestação e estão associadas às ações humanas incluem a urbanização e o desenvolvimento de infraestruturas, a exploração excessiva de madeira para combustível e a extração ilegal ou insustentável de madeira.
A verdade por detrás dos impactos ambientais do cultivo da soja.
A produção de soja está, atualmente, associada a elevados custos ambientais, mas a maioria não é cultivada pelas razões que pensamos. O verdadeiro impulsionador por trás do cultivo excessivo de soja não é o setor de base vegetal (cujas vendas aumentaram 21 %, na Europa, entre 2020 e 2022) , mas sim a indústria da carne, laticínios e ovos.
Isso ocorre porque a grande maioria da soja produzida no mundo – 77 % – tem como destino a alimentação dos animais de pecuária. Apenas 7 % é transformada em produtos de soja para consumo humano (incluindo sob a forma de produtos como tofu, bebida de soja, tempeh, entre outros). Por sua vez, cerca de 4 % é utilizada para biocombustíveis, lubrificantes e outros processos industriais, sendo que o biodiesel representa 2,8 % da produção.
Em média, cada europeu consome, aproximadamente, 61 kg de soja por ano, essencialmente de forma indireta através de produtos de origem animal, por via, entre outros, do consumo de aves (responsável por 37 % da produção global de soja), carne de porco (responsável por cerca de 20 % da produção de soja), mas também por via do consumo de peixe produzido em aquicultura.
Os produtos à base de soja são, em geral e por si só (quando produzidos para consumo humano direto), menos poluentes do que os alimentos de origem animal, se tivermos em conta o total de gases de efeito estufa gerados ao longo da cadeia de produção e distribuição alimentar. A título de exemplo, 1 kg de bife pode gerar até 99 kg de gases de efeito estufa, com a maior parte das emissões a serem provenientes da atividade agropecuária, enquanto o tofu, derivado da soja, gera apenas 3,2 kg de gases de efeito estufa por kg.
Atentando na pegada hídrica, 1 litro de bebida de soja, por exemplo, requer 297 litros de água, dos quais 99,7 % referem-se à cadeia produtiva, já a pegada hídrica de um hambúrguer de soja de 150 gramas é de 158 litros, dos quais 99,9 % referem-se à cadeia de distribuição. Por outro lado, contrastando, a pegada hídrica média global de um hambúrguer de bovino de 150 gramas é de 2350 litros e a de 1 litro de leite de vaca é de 1050 litros.
Quais são os principais países produtores de soja? Como se posiciona a União Europeia e Portugal?
No mapa que se segue, vemos a distribuição da produção de soja pelo mundo. A maior parte da soja, a nível mundial, é proveniente apenas de dois países: Estados Unidos e Brasil. Juntos, representam mais de dois terços (69 %) da produção global de soja.
A maior concentração de desflorestação devido à produção de soja ocorre no conjunto de países que constituem a América do Sul, destacando-se o Brasil, a Argentina, a Bolívia e o Paraguai. Tendo-se verificado um aumento na área destinada ao cultivo de soja, entre 2000 e 2019, em 160 % no Brasil e 57 % na Argentina. A expansão mais rápida ocorreu na Amazónia brasileira, onde a área de soja aumentou mais de dez vezes, de 0,4 Mha para 4,6 Mha.
Assim, a produção de soja no Brasil tem tido forte influência na desflorestação na região amazónica. Em 2006, sob pressão corporativa e de ONGs, os principais comerciantes de soja do mundo assinaram a Moratória da Soja do Brasil (SoyM) – o primeiro acordo voluntário de “desflorestação zero” do mundo. Os comerciantes concordaram que não comprariam soja cultivada em terras desflorestadas na Amazónia brasileira, após julho de 2006. No geral, foi um sucesso: nos dois anos anteriores ao acordo, 30% da expansão da soja na região ocorreu às custas da floresta; depois, o desmatamento diminuiu drasticamente e, em 2014, apenas 1 % da expansão estava a converter florestas em terras para a produção de oleaginosas.
Contudo, prevê-se um aumento no consumo global de carne, na próxima década, em 14 %, até 2030, comparativamente com a média do período de 2018 a 2020, impulsionado, em grande parte, por um maior rendimento disponível e pelo crescimento populacional. A oferta de carne bovina, suína, de aves e ovina deverá crescer 5,9 %, 13,1 %, 17,8 % e 15,7 %, respetivamente, até 2030. Esta crescente procura global por carne pode conduzir a mais desflorestação, para fins de cultivo de ração animal à base de soja.
Em particular, o consumo na União Europeia (UE) é responsável por cerca de 10 % da desflorestação global (e 16 % pelos danos causados às florestas tropicais), principalmente no que refere ao óleo de palma e à soja, que representam mais de dois terços dos produtos consumidos.
Depois da China, a União Europeia é o segundo maior importador de soja do mundo para fins pecuários (muito devido à pecuária industrial): cerca de 87 % da soja usada na UE é para ração animal, com sérias consequências para a biodiversidade e para o clima. Nos últimos 20 anos, a produção global de soja mais do que duplicou, precisamente impulsionada pela procura por ração animal para produzir carne, ovos e laticínios.
Assim, parar as importações de produtos que causam desflorestação é essencial para reduzir danos globais nos ecossistemas e biodiversidade.
Em termos de consumo per capita associado à desflorestação tropical, Portugal ocupa a 6ª posição entre os países da União Europeia, estando em 9º lugar no que diz respeito à desflorestação importada dos trópicos. A soja, o óleo de palma e a carne bovina são os produtos importados pela União Europeia com maior associação à desflorestação tropical. A taxa mais elevada de desflorestação associada ocorre nas importações provenientes do Brasil, Indonésia, Argentina e Paraguai.
A soja é uma alternativa sustentável à carne?
Ironicamente, consumir soja como alternativa à proteína de origem animal contribui para mitigar as alterações climáticas.
Por exemplo, para produzir uma determinada quantidade de proteína de soja requer-se cerca de 3 vezes menos área de terra do que para produzir a mesma quantidade de proteína de frango, 9 vezes menos comparando com a carne de porco e 32 vezes menos face à carne bovina.
Trocar o consumo de produtos de origem animal pelo consumo de alternativas à base de soja permite alimentar mais pessoas, requer uma quantidade menor de terra e de recursos hídricos e conduz a menos emissões de gases de efeito estufa.
Conclusão
A crença de que o consumo de soja por vegetarianos é responsável pela destruição ambiental é um mito perpetuado, já que, na realidade, a grande maioria da soja é cultivada para a produção de ração animal. A soja, quando consumida diretamente por pessoas, é uma alternativa alimentar ecologicamente amigável e mais eficiente, em termos de uso de recursos naturais, do que a produção de produtos de origem animal.