Desflorestação e uso ineficiente da terra
No artigo do portal Sapo Lifestyle, a nutricionista Leonor Santos Loureiro refere que à medida que a produção de fontes vegetais aumenta verifica-se o desgaste dos recursos naturais pela plantação e cultivo massivo. No entanto, a pecuária utiliza cerca de 80% das terras agrícolas do mundo e está entre os principais impulsionadores da desflorestação na Amazónia. Commodities como carne de bovino, soja (para alimentação animal) e óleo de palma estão entre os principais responsáveis pela desflorestação mundial, sendo que, em Portugal, 35% da desflorestação associada às importações tem origem no Brasil. A commodity com mais impacto na desflorestação importada do Brasil por Portugal é a soja (39,6%), destinada sobretudo à alimentação animal, seguida por produtos pecuários (28,8%).
Pesquisas da Universidade de Oxford indicam que se todos adotassem uma dieta vegana, o uso global de terras agrícolas poderia ser reduzido em 75%. Isso equivaleria a liberar uma área do tamanho dos Estados Unidos da América, China, Austrália e União Europeia combinados, que poderia ser usada para reflorestamento e recuperação de ecossistemas (permitindo maior sequestro de carbono e mitigação das alterações climáticas).
Segurança alimentar, necessidade de alimentar todas as pessoas e escassez de alimentos
A nutricionista Leonor Santos Loureiro indica que a produção massiva de alimentos vegetais poderia levar a uma escassez de alimentos no futuro.
De acordo com um relatório da consultora Profundo, uma redução de 30% na produção de carne bovina, em regiões chave, equivaleria a um corte na disponibilidade de proteína de cerca de 3,4 milhões de toneladas. Cultivar uma mistura de culturas proteicas como feijões, ervilhas, aveia e soja nessas mesmas terras resultaria em pelo menos 52 milhões de toneladas adicionais de proteínas vegetais para consumo humano, considerando já as perdas ao longo da cadeia de abastecimento. Comparando com as proteínas vegetais atualmente disponíveis, de cerca de 346 milhões de toneladas, isso constituiria um aumento de 15%. Tendo em conta o crescimento da população global para 8,5 bilhões até 2030 e uma recomendação média de 60 g de ingestão de proteína por pessoa por dia, esse volume adicional de proteína poderia suprir as necessidades proteicas de mais de 28% da população mundial. Aplicando um consumo maior, comparável ao atual consumo da Europa Ocidental, de 79 g por dia per capita, ainda forneceria um adicional de 21% de proteína. Em comparação, o fornecimento de proteína da produção de carne bovina substituída sustentaria as necessidades de menos de 2% da população global em 2030.
Acresce que alimentar humanos diretamente com produtos de origem vegetal, como soja, em lugar de os usar para alimentar animais que depois são consumidos pelos humanos, é significativamente mais eficiente e gera mais alimento disponível para as pessoas. Por exemplo, apenas 13% das calorias que um frango ingere se tornam calorias ingeridas pelas pessoas. No caso da carne de porco, apenas 9% das calorias ingeridas são aproveitadas para ingestão calórica das pessoas.
Ao reduzir o desperdício de recursos na produção de carne, mais alimentos estão disponíveis para consumo humano direto, melhorando a segurança alimentar global. Se o mundo adotasse uma dieta vegana, a agricultura atual poderia produzir mais alimentos para alimentar a população crescente sem necessitar de tanta terra.
Impacto económico e empregos
O artigo refere que a transição para uma dieta vegana causaria um impacto negativo na economia e aumento do desemprego.
Um estudo conjunto da Organização Internacional do Trabalho e do Banco Interamericano de Desenvolvimento descobriu que a transição para dietas de base vegetal pode resultar numa perda de 4,3 milhões de empregos, mas potencialmente criar 19 milhões de novos empregos em áreas como agricultura sustentável e produção de alimentos de base vegetal. A transição alimentar pode promover uma diversificação económica, reduzindo a dependência de setores agrícolas insustentáveis e fomentando a inovação em áreas como biotecnologia e agricultura vertical.
Acresce que trabalhadores de matadouros têm uma taxa mais alta de problemas de saúde mental, particularmente depressão e ansiedade. A transição para dietas de base vegetal reduziria a dependência de matadouros e promoveria melhores condições de trabalho na agricultura.
Desgaste dos recursos naturais
A nutricionista Leonor Santos Loureiro refere, no artigo, que a produção industrializada de alimentos vegetais levaria ao desgaste dos recursos naturais. Os produtos industrializados de base vegetal, homólogos à carne, têm sido considerados mais sustentáveis do ponto de vista ambiental em comparação com produtos de origem animal numa série de resultados, incluindo emissões de gases de efeito estufa e utilização da água e do solo. Não obstante, uma dieta vegana equilibrada privilegia alimentos não industrializados, como hortícolas, cereais integrais, oleaginosas e leguminosas, e não inclui, necessariamente, produtos industrializados. No entanto, de notar que alimentos classificados como processados ou ultraprocessados, mas com boa composição nutricional, podem fazer parte de uma alimentação vegetariana saudável.
Um estudo da Universidade de Oxford, que incluiu mais de 55 mil veganos, ovolactovegetarianos, pescetariano e consumidores regulares de carne e peixe, concluiu que as dietas veganas reduzem substancialmente o impacto no ambiente, conduzindo a 75% menos gases de efeito estufa, poluição da água e utilização do solo face aos impactos das dietas caracterizadas pelo consumo regular de carne. As dietas veganas também reduzem a destruição da vida selvagem em 66% e o uso de água em 54%.
As leguminosas, que são a base de muitos produtos processados saudáveis de base vegetal, como tofu, húmus e leguminosas em lata, possuem a capacidade de fixar azoto no solo, o que enriquece os ecossistemas agrícolas e reduz a necessidade de uso de fertilizantes sintéticos, contribuindo, assim, para a redução de gases de efeito estufa associados à agricultura.
Conclusão
A análise apresentada no artigo do portal Sapo Lifestyle, que reflete a opinião da nutricionista Leonor Santos Loureiro, sublinha preocupações sobre os possíveis efeitos ambientais negativos de uma transição global para uma dieta vegana. No entanto, ao considerar os dados e estudos disponíveis, muitos desses receios podem ser contestados e até mesmo refutados.
Segundo a AVP, é importante reconhecer que uma transição global para uma dieta vegana não é realista devido a inúmeros fatores culturais, gastronómicos e sociais que influenciam os hábitos alimentares das pessoas. A diversidade cultural e as tradições alimentares profundamente enraizadas levam a que mudanças alimentares drásticas encontrem resistência e sejam difíceis de implementar de forma homogénea.
Essa resistência coexiste com um elevado consumo de carne que tem vindo a estar associado a elevadas emissões de gases de efeito estufa e sobre-exploração de recursos naturais. Segundo um estudo publicado pela Faculdade de Direito da Universidade de Harvard, a maioria dos especialistas envolvidos (92%) concorda que a redução das emissões do setor pecuário é importante para limitar a temperatura global terrestre a um máximo de 2°C acima dos níveis pré-industriais, e que as emissões pecuárias devem ser reduzidas tanto quanto possível para mitigar o risco de temperaturas superiores a 1,5°C.
“Os profissionais de saúde têm a responsabilidade de não desvalorizar a atual situação de consumo excessivo de carne, quatro vezes superior ao recomendado, contrapondo com cenários irrealistas que não são sustentados pela evidência científica. Existe um consenso entre os especialistas de que as pessoas, principalmente nos países desenvolvidos, precisam de mudar os seus hábitos alimentares e de aumentar o consumo de fontes proteicas de base vegetal”, lê-se no Comunicado da AVP.