fbpx

Será que estamos a viver a sexta extinção em massa do planeta Terra?

Nos últimos tempos, têm-se publicado diversas notícias sobre a possibilidade de estarmos a viver a sexta extinção em massa no Planeta Terra, por exemplo. Estas notícias reportam-se à publicação de alguns estudos, em particular, um estudo divulgado pela revista Science (em finais de Abril), no qual se chama a atenção para o perigo das alterações climáticas em curso.
Será que estamos a viver a sexta extinção em massa do planeta Terra

Partilha este artigo:

De acordo com os autores desse estudo, se não houver qualquer mudança nos níveis da emissão de gases com efeito de estufa, estaremos na real iminência de colocar em perigo milhares de espécies – sendo que é cada vez maior o número de espécies em perigo de extinção.

Paralelamente, vivemos tempos incertos: a pandemia provocada pela Covid e a guerra entre a Rússia e a Ucrânia relegaram as preocupações com o ambiente para segundo plano. Mais do que isso, agravaram os problemas relacionados com a poluição e com a escassez dos recursos. O que significa que as acções que estavam a ser estudadas e implementadas para diminuir os níveis de poluição e afins, sofreram um enorme retrocesso, conforme já foi noticiado.

Como que a confirmar o parágrafo anterior, se todos os países consumissem como se consome em Portugal, a partir de 7 de Maio acabaríamos com os recursos previstos para este ano de 2022.

pegada ecologica portugal 4
Ilustração de Inês Figueiredo, concebida para o projeto Proteína Verde, sobre a pegada ecológica dos portugueses, de acordo com dados do estudo desenvolvido pela associação ZERO em parceria com a Global Footprint Network.

Perante a possibilidade de uma nova extinção em massa, é de referir que nas anteriores cinco grandes extinções em massa, os seres humanos não tiveram qualquer responsabilidade. Pelo contrário, desta vez, são inúmeras as evidências que demonstram que a acção humana é, de facto, uma das principais causas (quando não, a única) para a possibilidade de uma extinção em massa – incluindo da nossa própria espécie.

O que significa extinção em massa?

As extinções são uma parte normal da evolução: ocorrem natural e periodicamente ao longo do tempo, naquilo que se designa de ‘taxa natural de extinção’. Existe, então, uma taxa natural para o tempo e frequência das extinções: 10% das espécies são perdidas a cada milhão de anos; 30% a cada 10 milhões de anos; e 65% a cada 100 milhões de anos. A evolução ocorre através do equilíbrio da extinção – o fim das espécies – e da especiação – a criação de novas espécies.

Mas uma extinção em massa é definida como um período no qual se observa uma taxa de extinção muito mais elevada do que o normalé definida quer pela magnitude, quer pela taxa: magnitude é a percentagem de espécies que se perdem; a taxa é a rapidez com que isto acontece. 

overheating planet earth global warming campaign mixed media

Estas duas métricas estão estritamente ligadas, sendo ambas necessárias para se ‘diagnosticar’ uma extinção em massa. Se muitas espécies forem extintas durante um período muito longo (digamos, mil milhões de anos), isto não é uma extinção em massa. O ritmo é demasiado lento. Da mesma forma, se perdêssemos algumas espécies muito rapidamente, sem que no final se tratasse de uma grande percentagem de espécies, também não se qualificaria como extinção em massa – a magnitude é demasiado baixa. Para se definir um evento como uma extinção em massa, o planeta precisa de perder muitas espécies muito rapidamente.

Assim sendo, para se considerar uma extinção em massa teriam de se perder mais de 75% das espécies, num período curto: cerca de 2 milhões de anos. Algumas extinções em massa acontecem mais rapidamente do que isto.

As ‘Cinco Grandes’ extinções em massa

Como é sabido, o planeta Terra já sofreu várias grandes extinções de espécies em massa. Desde logo, temos no nosso imaginário colectivo a extinção dos dinossauros, há 65 milhões de anos, durante a qual desapareceram cerca de 75% das espécies. Todavia, antes dessa grande extinção em massa, aconteceram outras quatro, ainda mais mortíferas – todas provocadas por fenómenos naturais: meteoritos, supervulcões ou até mesmo a explosão de uma supernova.

No gráfico seguinte, podes observar o calendário dos acontecimentos na história da Terra, cujos picos nas taxas de extinção são marcados como os cinco eventos:

Big Five Mass Extinctions
  • Evento 1: Extinção do Ordoviciano-Siluriano – ocorreu há 440 milhões de anos e extinguiu organismos marinhos. Cerca de 86% das espécies existentes foram dizimadas. A causa foi uma mudança climática severa que alterou a temperatura do mar, causando a morte da maior parte das vidas no oceano. 
  • Evento 3: Extinção do Permiano-Triássico – também conhecida informalmente como a Grande Mortandade, esta extinção em massa terá ocorrido  há cerca de 252 milhões de anos, provocando o desaparecimento de 95% das espécies marinhas e 70% das espécies terrestres. Terá acontecido devido a uma intensa actividade vulcânica na Sibéria, que terá causado o aquecimento global. Os níveis elevados de CO2 e enxofre (H2S) dos vulcões causaram acidificação oceânica, chuva ácida e outras alterações na química dos oceanos e da terra. 
  • Evento 4: Extinção do Triássico-Jurássico – ocorreu há 200 milhões de anos devido à actividade vulcânica submarina na Província Magmática do Atlântico Central, tendo provocado o aquecimento global e uma mudança dramática na composição química dos oceanos. 

Se estas cinco grandes extinções em massa foram provocadas por fenómenos naturais, é consensual que existe uma espécie responsável pelo desaparecimento de quase todas as outras – a espécie humana.

O que significa ameaça de extinção?

Depois de vermos o que se entende por extinção em massa, importa, agora, perceber o que significa ‘ameaça de extinção’. A Lista Vermelha da IUCN categoriza as espécies com base na sua probabilidade estimada de extinção dentro de um determinado limite de tempo. Estas estimativas têm em conta a grandeza da população, a taxa de mudança no tamanho da população, a distribuição geográfica, bem como a extensão das pressões ambientais sobre as mesmas. As espécies ‘ameaçadas’ são a soma das três categorias seguintes:

  • As espécies criticamente ameaçadas têm uma probabilidade de extinção superior a 50% em dez anos ou três gerações;
  • As espécies ameaçadas têm uma probabilidade de extinção superior a 20% em 20 anos ou cinco gerações;
  • As espécies vulneráveis têm uma probabilidade superior a 10% ao longo de um século.

A Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da IUCN faz esta avaliação todos os anos; em 2020, avaliou 35.765 espécies em todos os grupos taxonómicos a serem ameaçadas de extinção: um quarto dos mamíferos do mundo, uma em cada seis espécies de aves e 40% dos anfíbios estão ameaçados. 

image
Mais de um terço das moscas-das-flores estão ameaçadas de extinção na Europa, de acordo com a Lista Vermelha da IUCN.

Como as aves, os mamíferos e os anfíbios são os grupos mais bem estudados, o seu número é o reflexo mais preciso do número verdadeiro. O mesmo não se pode dizer em relação aos grupos dos insectos, plantas e fungos, cujo número de espécies estudadas é muito inferior. 

Na verdade, o número de espécies ameaçadas está subestimado, uma vez que apenas 6% das espécies descritas foram avaliadas (para alguns grupos, isto é muito menos), sendo inevitável que haja mais espécies ameaçadas dentro das 94% que não foram avaliadas.

Estaremos a caminho de uma sexta extinção em massa?

Para fundamentar o alerta que um crescente número de cientistas vem vindo a fazer para a possibilidade de estarmos a entrar na sexta extinção em massa, destacamos um estudo recentemente publicado na revista Biological Reviews – que inclui invertebrados na lista das espécies em perigo de extinção, uma categoria de vida frequentemente ignorada no âmbito deste tema, mas que representa um  importante indicador do estado de saúde da biodiversidade do planeta Terra.

“A inclusão de invertebrados foi fundamental para confirmar que estamos de facto a assistir ao início da sexta extinção em massa na história da Terra”.

Robert Cowie da Universidade do Hawaii, em Mano, o principal autor do estudo.

Na perspectiva dos autores deste estudo mais recente, o problema da Lista Vermelha está no facto de avaliar “uma fracção ínfima de invertebrados. A incorporação de estimativas do verdadeiro número de extinções de invertebrados leva a concluir que a taxa excede largamente a ‘taxa de fundo’ [taxa de base (normal)] e que podemos de facto estar a assistir ao início da 6ª extinção em massa”.

Ao incluírem os invertebrados, os cientistas estimam que desde 1 500 d.C., a Terra já terá perdido cerca de 150 000 a 260 000 espécies de invertebrados.

“As taxas drásticas de extinção de espécies e o número decrescente de muitas populações animais e vegetais estão bem documentadas, no entanto, alguns cientistas negam que estes fenómenos equivalham à extinção em massa. Esta negação baseia-se numa avaliação altamente enviesada da crise que se concentra nos mamíferos e aves e ignora os invertebrados, que constituem, naturalmente, a grande maioria da biodiversidade”.

Robert Cowie

Esta crise revela-se de forma mais clara quando se analisam as taxas de extinção nas ilhas. Em locais como as ilhas havaianas e a Polinésia Francesa, a perda de espécies é mais dramática. A título ilustrativo, desde o início da colonização humana, há alguns milhares de anos, que se extinguiram 2 000 espécies de aves nas ilhas do Pacífico. Isto equivale a quase 1/6 da actual fauna de aves a nível mundial.

Segundo os autores deste estudo recente, os invertebrados, como os caracóis terrestres, são altamente diversificados e estritamente endémicos; ou seja, são uma espécie que tem um habitat muito pequeno, tal como uma ilha ou uma área de uma ilha. Em Rurutu, uma ilha da Polinésia Francesa, 19 espécies de moluscos viveram ali. Apesar de extensas buscas realizadas na vegetação nativa que resta, os cientistas só conseguiram encontrar conchas vazias. A totalidade das 19 espécies está na lista das espécies extintas.

image 1

As ilhas da Polinésia Francesa, como a Rapa acima retratada, foram outrora o lar de 100 espécies endémicas de caracóis terrestres, 59 espécies endémicas de plantas e 67 espécies endémicas de gorgulhos. Agora, são na sua maioria estéreis. Os incêndios e o sobrepastoreio têm destruído grande parte do habitat de altitude superior, enquanto espécies invasoras dominam a vegetação em altitudes inferiores. Imagem obtida através da Universidade do Hawaii / B. Fontaine.

Os seres humanos são a única espécie capaz de manipular a biosfera em grande escala.
Não somos apenas mais uma espécie a evoluir face a influências externas. Em contraste, somos a única espécie que tem escolha consciente em relação ao nosso futuro e ao da biodiversidade da Terra”.

Robert Cowie relembra que

Neste contexto, podemos escolher um de dois caminhos: 

  1. Como refere Robert Cowie, continuar a “negar a crise, aceitá-la sem reagir, ou mesmo encorajá-la, constitui uma revogação da responsabilidade comum da humanidade e abre o caminho para que a Terra continue na sua triste trajectória rumo à 6ª extinção em massa”; ou
  2. Impedir que a sexta extinção em massa aconteça.

Com efeito, podemos evitar uma sexta extinção em massa. As anteriores grandes cinco extinções em massa foram impulsionadas por uma cascata de eventos naturais.

Desta vez é diferente. A humanidade é o principal motor destas mudanças ambientais: desflorestação, alterações climáticas, acidificação dos oceanos, caça e poluição dos ecossistemas. 

Ainda que isto seja deprimente, significa que temos a oportunidade (e alguns argumentariam, a responsabilidade) de o impedir. 

image 5
O hipopótamo comum é uma das espécies afetadas pela seca, como resultado das mudanças climáticas provocadas pelo homem. Crédito imagem: Notícia do jornal The Guardian, de 2016, sobre o facto da agricultura e do consumo excessivo da população criarem mais ameaças à vida selvagem do que as mudanças climáticas. Fotografia: Thomas Mukoya/Reuters.

Resta saber se há vontade e coragem de tomar as medidas necessárias. 

Artigo da autoria de Ana Luísa Pereira

Fontes:

https://ourworldindata.org/extinctions
https://www.science.org/doi/10.1126/science.abe9039?adobe_mc=MCMID%3D29698177783161553781019942577671622338%7CMCORGID%3D242B6472541199F70A4C98A6%2540AdobeOrg%7CTS%3D1651221524&_ga=2.22676219.1141218241.1651221491-567200943.1648579245
https://brasil.elpais.com/brasil/2015/06/19/ciencia/1434727661_836295.html
https://earthsky.org/earth/6th-mass-extinction-in-progress-invertebrates/

Este artigo foi útil?

Considera fazer
um donativo

A AVP é uma organização sem fins lucrativos. Com um donativo, estarás a ajudar-nos a a criar mais conteúdos como este e a desenvolver o nosso trabalho em prol dos animais, da sustentabilidade e da saúde humana.

Considera
tornar-te sócio

Ao tornares-te sócio da AVP, estás a apoiar a nossa missão de criar um mundo melhor para todos enquanto usufruis de inúmeros benefícios!

Queres receber todas as novidades?

Subscreve a newsletter AVP

Mais artigos em

Mais artigos em

Mais lidos

Subscreve

a Newsletter

Não percas um grão do que se passa!